A queixa de baixa estatura é muito frequente nos consultórios de pediatria e endocrinologia e requer acompanhamento e análise criteriosa para avaliação do problema. É considerado baixa estatura as crianças que, na curva de crescimento da população geral, estão abaixo do percentil 2,5 (ou 2DP). Pode-se também considerar anormal, crianças que estão muito abaixo do seu potencial de crescimento genético baseado na altura dos pais. O alvo genético, apesar de pouco acurado e não prever a estatura final, serve para avaliarmos, através da altura dos pais, se a criança se encontra muito fora desse canal de crescimento.
O prognóstico do crescimento é melhor avaliado pela evolução do estágio puberal e do acompanhamento com a idade óssea. O atraso da idade óssea pode ser um dado positivo em uma criança com baixa estatura, por exemplo. Os desvios da normalidade do crescimento representam aproximadamente 90% das queixas de baixa estatura e são representados pela Baixa Estatura Familiar (BEF) e pelo Retardo Constitucional do Crescimento e Puberdade (RCCP), ambos são condições benignas, com boa evolução e sem necessidade de tratamento. A BEF decorre de um padrão genético de baixa estatura, a criança apresenta velocidade de crescimento normal, perfil hormonal normal e idade óssea compatível com a idade cronológica e a previsão de estatura final condiz com o padrão familiar. No RCCP a idade óssea está atrasada, o ritmo de crescimento é normal, a puberdade e o estirão de crescimento aparecem numa idade mais avançada porém sem comprometimento da estatura final, sendo compatível com o padrão familiar. Uma vez descartado as variações de normalidade da baixa estatura, deve-se investigar doenças como a Síndrome de Turner na menina, através da realização de cariótipo dada a grande prevalência (1:60 meninas abaixo do percentil 3), doença celíaca em ambos os sexos independente de sintomas específicos (distensão abdominal, diarréia crônica e emagrecimento), uma vez que a baixa estatura pode ser o único sinal presente, hipotireoidismo com a dosagem dos hormônios tiroidianos e a deficiência do hormônio do crescimento com a dosagem do IGF-1(fator de crescimento semelhante à insulina) e IGFBP-3 (proteína carreadora de IGF-1), peptídeos secretados pelo fígado na presença do hormônio do crescimento (GH) e testes farmacológicos de secreção, como teste da clonidina, insulina e glucagon.
A deficiência do hormônio de crescimento pode ser de causas congênitas, provocadas por defeitos genéticos e causas adquiridas, que incluem os tumores suprasselares, processos inflamatórios, infecções do sistema nervoso central, traumatismo craniano e pós-irradiação. A depender da causa, o tratamento fica direcionado para a doença de base, sendo as indicações atualmente aceitas para reposição com hormônio do crescimento (GH) a deficiência de GH, a insuficiência renal crônica, a síndrome de Turner, a síndrome de Prader-Willi, o retardo de crescimento intrauterino (RCIU) e a síndrome de Noonan. O hormônio do crescimento biossintético deve ser administrado por via subcutânea diária na dose de 0,1 a 0,2 Ui/Kg ajustadas de acordo com a velocidade de crescimento e o estadio puberal.
Puberdade Precoce
A puberdade precoce é definida como o aparecimento de caracteres sexuais antes dos 8 anos na menina e dos 9 anos nos meninos. Nas meninas, o primeiro sinal de puberdade é geralmente o aumento do tecido mamário (telarca) e nos meninos, o aumento do volume testicular acima de 4 ml, ambos indicando maturação do eixo gonadotrófico e aumento dos níveis de LH, FSH, estradiol e testosterona. O limite cronológico da puberdade precoce é bastante discutível, uma vez que dados americanos recentes mostraram que quase 30% das meninas afro-americanas iniciam a puberdade antes dos 7 anos de idade. A menarca antes dos 9 anos em meninas pode ser considerada um critério adicional de precocidade sexual. A puberdade precoce pode ser classificada em central, quando dependente do eixo hipotalâmico-hipofisário se assemelhando ao desenvolvimento fisiológico, ou periférica. A puberdade precoce central é mais comum, porém um evento raro acometendo 1:5.000 a 1:10.000 crianças e é mais frequente no sexo feminino.
Nas meninas, cerca de 90% dos casos de puberdade precoce é de causa desconhecida ou idiopática, ao contrário dos meninos, em que a grande maioria apresenta uma causa subjacente para o desenvolvimento precoce da puberdade, sendo o hamartoma hipotalâmico, malformações congênitas não tumorais, a causa mais frequente. A avaliação da puberdade precoce inclui o aparecimento de caracteres sexuais secundários e sua velocidade de progressão (oleosidade da pele, acne, presença de comedões, presença de odor e pelos axilares), exame antropométrico (peso e altura), cálculo da idade estatural e do desvio-padrão da altura em relação à idade cronológica, raio X de punho e mão não dominantes para determinar a idade óssea, utilizada para predição da estatura adulta, a ultrassonografia pélvica em meninas que auxilia a avaliação dos volumes uterino e ovarianos (são considerados púberes o volume ovariano > 1,5 mL) além da ressonância magnética da região hipotálamo-hipofisária, visando à detecção de tumores e malformações.
A avaliação laboratorial das gonadotrofinas, em especial do LH basal ou pós estímulo com GnRH é utilizada para determinar a ativação do eixo gonadotrófico. LH basal > 0,6 U/L (método imunofluorométrico – IFMA) ou > 0,2 U/L (método quimioluminescência – ICMA) em ambos os sexos é considerado puberal. Os valores de estradiol no sexo feminino não são utilizados para diagnóstico da puberdade precoce devido sua baixa sensibilidade, ao contrário, os valores de testosterona no sexo masculino são sensíveis para o diagnóstico.
O tratamento da puberdade precoce tem como principais objetivos detectar e tratar as lesões expansivas intracranianas, bloquear a maturação sexual, estabilizar os caracteres sexuais secundários, desacelerar a maturação esquelética, preservar o potencial de estatura normal e evitar problemas psico-sociais nessas crianças. A base do tratamento é com análogos do GnRh como o acetato de leuprolide e triptorrelina, medicações de uso subcutâneo ou intramuscular, com injeções mensais ou trimestrais. A manutenção do tratamento deve estender-se até a época adequada para o início da puberdade.
Dra. Vanessa Aoki Santarosa Costa
Médica Endocrinologista formada pela Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo
Mestrado pela Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo
Atua em consultório médico particular na Vila Mariana, Zona Sul, São Paulo.