Em agosto desse ano, as três principais sociedades médicas que tratam do colesterol, a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, a Sociedade Brasileira de Cardiologia e a Sociedade Brasileira de Diabetes, publicaram a Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose 2017. Essa diretriz segue a tendência mundial dos principais consensos sobre o colesterol cujo lema é: "quanto menor melhor”. Diversos estudos mostram que, para uma população de alto risco cardiovascular, quanto menor os níveis de colesterol LDL (o colesterol ruim) menor é o risco de infarto, AVC e outras doenças cardiovasculares e menor também é a mortalidade. O maior rigor nas metas de colesterol também foi possível graças a uma nova classe de remédios recentemente lançada no Brasil, os inibidores da PCSK9 (Protein Convertase Subtilisin/Kexin type 9). A PCSK9 é uma protease envolvida na degradação dos receptores de LDL na superfície das células do fígado. Estes receptores são os responsáveis por capturar as partículas de LDL circulantes no sangue e, posteriormente, internalizá-las dentro do fígado, levando assim à redução dos níveis de LDL-c séricos. Quanto mais ativa a PCSK9 maior a destruição dos receptores e, por consequência, maior a concentração de LDL no sangue. Essas medicações, disponíveis para a comercialização com os nomes de Rephata (evolocumabe) e Praluent (alirocumabe) são anticorpos monoclonais que inibem a atividade da protease PCSK9 levando assim a uma redução dos níveis de LDL-c. Os trabalhos com essa classe nova de remédios mostram uma significativa redução do colesterol ruim em até 70%, meta que as medicações até então existentes, as estatinas, não atingiam. São medicações com custo elevado, administradas por via subcutânea a cada 2 ou 4 semanas e indicadas para casos específicos: pacientes com diagnóstico de hipercolesterolemia familiar, pacientes com intolerância a altas doses de estatina e pacientes que a despeito do uso de estatina em dose máxima não atingiram as metas de colesterol. Os estudos GLAGOV e FOURIER avaliaram os benefícios do medicamento Repatha (evolocumabe) em pacientes de alto risco cardiovascular e mostraram que 90% dos pacientes conseguiram diminuir os níveis de LDL-c abaixo de 70mg/dL e 64% dos pacientes tiveram regressão nas placas ateroscleróticas, duas vezes mais que o proporcionado pela estatina, o tratamento padrão. Além disso houve uma redução adicional de eventos cardiovasculares na ordem de de 20%.
A principal novidade da diretriz são os índices do LDL-c que terão seus valores de referência conforme o risco cardíaco do paciente. A estratificação do risco cardiovascular passa a ser peça chave na decisão das metas do LDL-c. Pessoas com risco cardíaco muito elevado com doença aterosclerótica estabelecida, ou seja, aquelas que já apresentaram um infarto, derrame ou amputações devido a uma doença arterial, passarão a ter metas de LDL-c menores do que 50 mg/dl (anteriormente era 70mg/dl). Pessoas que não têm fatores de risco podem ter esse índice de até 130 mg/dl.
A diretriz recomenda a estratificação do risco cardiovascular pela ferramenta “Escore de Risco Global” (ERG), que estima o risco de infarto do miocárdio, AVC, ou insuficiência cardíaca, fatais ou não fatais, ou insuficiência vascular periférica em 10 anos, para decisão de usar ou não estatina, e depois utiliza metas de LDL para definir a dose da medicação. Para facilitar a avaliação dos médicos sobre o grupo de risco em que se enquadram os pacientes, a SBC lançou um aplicativo gratuito:
A ferramenta permite que o profissional preencha dados como idade do paciente, doenças crônicas e eventos prévios como infarto e AVC para determinar em qual grupo de risco ele está e, assim, conferir qual o valor de colesterol considerado ideal. Em resumo:
É importante frisar que o escore de risco global é dinâmico, pois com os anos tanto os fatores de risco podem se intensificar como podem reduzir o risco calculado do paciente quando intervenções farmacológicas ou não farmacológicas são empregadas. A diretriz recomenda que na vigência de tratamento medicamentoso mesmo que os níveis de LDL atingidos sejam menores do que a meta estabelecida, a dose e a intensidade do tratamento sejam mantidas.
Outro ponto importante abordado na diretriz é a recomendação do uso de ezetimibe como opção terapêutica nos casos em que a meta de LDL não foi atingida ou na intolerância ao uso das estatinas. Essa medicação, um inibidor na absorção do colesterol, foi lançada no mercado na década passada e apesar de eficaz na redução do LDL colesterol não havia estudos comprovando redução do risco cardiovascular. Contudo, o estudo IMPROVE-IT mostrou uma discreta porém significativa redução do risco cardiovascular em paciente de alto risco que fizeram uso da associação sinvastatina+ezetimibe versus o grupo que só usou a estática. Portanto, essa medicação também é recomendada para o tratamento da dislipidemia.
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